Neste domingo estarei com uma intoxicação alimentar

Neste domingo estarei com uma intoxicação alimentar graças ao ovo da páscoa oferecido pela dona Adelina do segundo andar. Antes disso, pela hora do almoço, comerei cabrito, como é habitual nestes dias e enfrascar-me-ei com duas ou três garrafas de tinto. Não comerei sobremesa, contentar-me-ei com o insípido café de saco e, minutos depois, proporcionarei ao meu cão um agradável passeio que o fará exercitar as patas e defecar um pouco.
Não pensarei em nada, aliás como é meu costume, nem farei esforços por trocar simpáticas palavras com os vizinhos. Quando voltar a casa, entrarei no quarto da minha mãe avisando que o cão tivera defecado menos do que o habitual, ao que a minha mãe responderá que aquilo é apenas uma fase em que o bicho anda mais preso. Passarei então até à sala onde encontrarei o meu pai a jogar cartas com o meu tio fino. Serei convidado a jogar, mas tal não realizar-se-á, o crapô é um jogo disputado por dois jogadores, direi eu. O meu pai dirá, este meu filho devia ser cientista e depois, juntamente com o tio fino, soltará uma breve gargalhada. Nesta altura, estarei extremamente entediado e pensarei sobre as possibilidades que aquele dia poderá encerrar. Chegarei à conclusão de que não poderei esperar por nada de excitante. É nesta atura que,

Me sento à janela. A minha mãe toca-me no ombro com um sorriso de domingo. Tem na mão um objecto com forma de ovo embrulhado num papel que não sei definir, diz-me, foi a dona Adelina que deixou para ti. Começo a despir aquilo que me parece ser um ovo e, no papel que não sei definir estão as minhas tardes na casa da dona Adelina, eu pequeno, a dona Adelina uma espécie de ATL. No caderno de duas linhas, a escavadora borracha porque, o menino não pode sair por fora. Bolacha Maria esmigalhada com sumo de laranja e banana, lá fora, leite achocolatado, pães com manteiga, bolos, santa ignorância, meses, anos, hoje temos um docinho para o lanche, lá fora guloseimas, hoje temos um doce para o lanche, Bolacha Maria esmigalhada com sumo de laranja e banana. Pouco antes da minha mãe chegar, era certo, os dedos da dona Adelina penteavam o meu cabelo. É só por isso que a perdoo. Só por isso. Como se a velha fosse um monstro, como se no momento em que penteava o meu cabelo com as suas mãos, a dona Adelina fosse uma anjo.
Seguro um ovo de chocolate, foi a dona Adelina do segundo andar que mo deu. Sento-me em frente à televisão e estaciono no Biography Channel. Fala-se sobre a depressão pós-parto da Brooke Shields. Começo a comer o ovo que a dona Adelina me deu e penso que a dona Adelina, caso tivesse tido filhos, não deveria ter sofrido desse mal, pobre dona Adelina, três gatos e um peixe. Quando acabo de comer o ovo de chocolate é altura de ir até à cozinha beber meia caneca de água. Pelas duas e trinta e cinco da manhã começo a sentir os primeiros sintomas.

1 comentário:

Anónimo disse...

Mesmo que em 2º plano e pelos motivos mais estranhos é sempre bom que se fale da Brooke Shields. :)